Teatro em Portugal - Instituições http://www.cvc.instituto-camoes.pt/base-teatro-em-portugal-instituicoes.html Sat, 06 Apr 2024 01:41:44 +0000 Joomla! - Open Source Content Management pt-pt Casa da Comédia http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/casa-da-comedia-dp15.html http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/casa-da-comedia-dp15.html

(Lisboa, 1946-1975)

A Casa da Comédia surgiu em 1946, pela mão de Fernando Amado, com a apresentação de um espetáculo no Teatro do Ginásio.

  Casa da Comédia
  Grupo fundador, 1962 [Arquivo pessoal de João Osório de Castro].

Voltou a realizar outra apresentação no mesmo espaço no ano seguinte, tateando o movimento experimental da época e os princípios estéticos que mais tarde formariam a sua identidade.

Adormecida durante quase vinte anos, a ideia da Casa da Comédia foi recuperada em 1962, desta vez com um espaço próprio e uma proposta estética mais definida, assente na modernidade das novas dramaturgias, e passando posteriormente pelo teatro do absurdo, o teatro político e o teatro épico, acompanhando as mudanças dos tempos e das vontades dos diferentes colaboradores e deixando uma marca profunda na geração teatral que ajudou a moldar, até ao seu término em 1975.

A Casa da Comédia teve origem na secção de teatro do Centro Nacional de Cultura e traduziu-se em duas apresentações públicas no Teatro do Ginásio: a 16 de junho de 1946 (o capricho teatral de Fernando Amado, A caixa de Pandora) e em maio de 1947 (a reposição de A caixa de Pandora, precedida dos “debuchos teatrais” O meu amigo Barroso, Música na igreja e O ladrão, bem como do sainete Novo mundo). Este grupo partilhou algumas afinidades estéticas com o movimento de teatro experimental que, no Portugal do pós-Segunda Guerra Mundial, se caracterizava por uma ânsia de renovação e atualização. A Casa da Comédia, depois destas duas apresentações, acabou por desaparecer. Reapareceu cerca de vinte anos depois, animada pelo mesmo diretor e por João Osório de Castro, com a mesma designação, mas desta feita como um grupo de teatro com um espaço próprio e com um núcleo de atores (amadores) relativamente estável.

A Casa da Comédia enquanto grupo de teatro com sede própria foi fundada em 1962, mas as suas portas só se abriram em julho de 1963. Entre estas duas datas foram realizadas as obras que transformaram uma antiga carvoaria numa sala de teatro, na Rua S. Francisco de Borja, nº 24, às Janelas Verdes, em Lisboa. Muitos dos que então se reuniram em torno de Fernando Amado viriam a ser figuras proeminentes do teatro contemporâneo em Portugal, tais como Fernanda Lapa, Manuela de Freitas, Maria do Céu Guerra, Santos Manuel, Glória de Matos, entre muitos outros. Para a inauguração do novo espaço foram escolhidos Verbo escuro e Regresso ao paraíso, de Teixeira de Pascoais, estreados a 19 de julho de 1963. Fernando Amado dirigiu o grupo até 1965, tendo particular interesse por textos de dimensão poética, por Gil Vicente e por peças representantes de uma moderna dramaturgia, tais como Deseja-se mulher, de Almada Negreiros.

A partir de 1965 e até 1975, sem a figura tutelar de Fernando Amado por perto, muitos foram os que se afastaram do grupo. As encenações deixaram de ter a (quase) exclusividade de uma só mão, passando a envolver outros elementos. Destacaram-se dois nomes, quer pelo número de encenações que realizaram com o grupo, quer pela projeção que vão alcançando no panorama teatral português: Norberto Barroca e Jorge Listopad. Contudo, muitos outros aí encontraram o espaço necessário à experimentação, fazendo da Casa da Comédia um dos espaços mais interessantes da capital: Filipe Ferrer, Maria Barreto Leite, Francisco Esteves, Serge Farkas, Francisco Relógio, Filipe La Féria, Tone Brulin, Artur Ramos, Vitor Poitout, João Osório de Castro, Marta Ribeiro, Jorge Vale, Herlânder Peyroteo, Fernanda Lapa, Carmen Gonzalez, João Lourenço e Morais e Castro.

O teatro do absurdo ou de pendor surrealizante encontrou na Casa da Comédia um palco dileto, mas, após o 25 de abril de 1974, e um pouco à semelhança do resto do panorama teatral português, rumou-se em direção a um teatro de natureza mais política. Em julho de 1974, Norberto Barroca regressou para encenar Um barco para Ítaca e outros poemas de Manuel Alegre, aliando poesia e música nesse projeto teatral. Com As espingardas da Mãe Carrar de Bertolt Brecht (janeiro de 1975), a mudança de rumo foi clara: o teatro épico, o teatro político, finalmente livre, chegava também à Casa da Comédia, com encenação de João Lourenço.

A 18 de junho de 1975, constituiu-se em sociedade artística o Grupo de Trabalhadores da Casa da Comédia, com o objetivo de trabalhar para um público mais vasto e menos favorecido, usando preferencialmente textos portugueses, já teatralizados ou coligidos pelo grupo, e dando atenção ao contexto socio-político. Acabaram por deixar cair o distintivo “Grupo de Trabalhadores” em 1981, recuperando o nome e até o logótipo inicial Casa da Comédia, acabando por dar longevidade e continuidade ao nome.

A Casa da Comédia enquanto grupo – o grupo experimental no contexto da ditadura, que marcou uma época e definiu uma geração teatral – encerrou-se em 1975, dando lugar a outras pessoas e outras estéticas. Contudo, a Casa da Comédia, uma carvoaria feita teatro de bolso, um espaço para a prática do teatro que a ideia de Fernando Amado e a paciente dedicação de muitos outros ofereceram à cidade, essa, iria continuar ainda que noutras modalidades e com diferentes protagonistas.

 

Bibliografia

COELHO, Rui Pina (2006). «A Casa da Comédia (1946-1975): De Fernando Amado a Bertolt Brecht» in Sinais de Cena, nº 6. Lisboa: APCT/CET. pp.121-128.

___ (2009). Casa da Comédia (1946-1975): Um palco para uma ideia de teatro. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda.

REBELLO, Luiz Francisco (2000). Breve história do teatro português, 5ª ed. Mem Martins: Publicações Europa-América.

 

Consultar a ficha de instituição na CETbase:

http://ww3.fl.ul.pt/CETbase/reports/client/Report.htm?ObjType=Instituicao&ObjId=6195

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Rui Pina Coelho/Joana d’Eça Leal/Centro de Estudos de Teatro

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cvinagre@instituto-camoes.pt (Cláudio Vinagre) Destaque Teatro em Portugal - Instituições Teatro em Portugal Wed, 09 May 2012 14:15:07 +0000
Companhia Rafael d’Oliveira, Artistas Associados http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/companhia-rafael-d-oliveira-artistas-associados-dp23.html http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/companhia-rafael-d-oliveira-artistas-associados-dp23.html

(1920-1975)

Na base da génese da companhia encontra-se a Trupe Silva Vale e a passagem da liderança da mesma do ator Silva Vale para Rafael de Oliveira, em 1918. A designação Companhia Rafael d’Oliveira surgiu como definitiva apenas em 1933.

  Companhia Rafael d'Oliveira
  O elenco da companhia na década de 50”, Rafael de Oliveira: O sonho de uma vida, caderno-programa nº 9 da Companhia
Teatral do Chiado, 1992.

Esta sociedade artística, que subsistia através das receitas dos seus espetáculos, assentava numa dinâmica familiar, em que qualquer um dos societários acumulava diversas funções que poderiam ser tanto de cariz artístico, como técnico ou administrativo. O elenco inicial contava apenas com dez artistas, entre eles Rafael de Oliveira e sua mulher Ema de Oliveira. Em 1936 e em nome de uma maior autonomia, surgiu um Teatro Desmontável – uma grande estrutura independente, movida, inicialmente, por via ferroviária e, mais tarde, em dez camiões – do qual a Companhia fez uso até outubro de 1974, quando o arrendou à Companhia Adoque, em Lisboa. A Companhia conheceu o seu período de maior sucesso durante as décadas de 1940 e 1950, chegando a realizar digressões às Ilhas, a Angola e a Paris. Do seu vasto repertório destacam-se peças como Amor de perdição (1921-1973), de C. C. Branco, A Rosa do adro (1922-1974), de Manuel Maria Rodrigues, e As duas causas (1933-1972), de Mário Duarte e Alberto Morais.

Esta Companhia de província percorreu o território nacional durante mais de 50 anos, representando um reportório eclético de caráter popular, de autores nacionais e estrangeiros, êxitos de bilheteira dos principais teatros de Lisboa e Porto, cujos ecos se repercutiam na província através de agrupamentos dramáticos amadores. Desde os melodramas oitocentistas de importação francesa (D’Ennery, Decourcelle, Sand ou Dumas) aos de criação nacional (Camilo Castelo Branco, Júlio Diniz ou Manuel Maria Rodrigues), o público provinciano acolhia com entusiasmo a adaptação folhetinesca das paixões sofridas, amores de salvação de Gaiatos de Lisboa, ou de perdição, de Teresas de Albuquerque ou de Rosas do Adro; e rejubilava com as comédias de Acácio Antunes e Baptista Diniz, dos teatros Chalets das Feiras de Março e Agosto, com a magia das oratórias de Braz Martins, das feeries dos velhos tempos do Variedades ao Salitre, e do Ginásio ao Chiado; com as operetas do teatro Apolo, e as ingénuas revistas de produção provinciana; mas também com os dramas sociais de Ramada Curto, com o modernismo de Luiz Francisco Rebello, e o teatro alegre de Ribeirinho e Henrique Santana.

Quando, em 1918, Rafael de Oliveira assumiu a liderança da Trupe de Silva Vale, a imprensa regional passou a designar a companhia pelo nome do seu diretor. As sucessivas designações iniciais – Troupe Dramática União (1918), Tournée Artística Societária (1921), Companhia Societária de Declamação (1925-28), Companhia de Opereta, Drama, Comédia e Revista (1929-32) –, culminaram, em 1933, no que era há muito vox populi: a Companhia Rafael d'Oliveira, Artistas Associados.

Este agrupamento plurifamiliar formalizara-se como sociedade artística, tendo como provento as receitas dos espetáculos. Possuía cenários próprios, adequados às peças representadas, e utilizados em mais do que um espetáculo, consoante o ambiente desejado. O guarda-roupa, propriedade individual dos artistas, compunha-se de peças base, concebidas de acordo com a tipologia das personagens representadas e uma estética de bom gosto. Como em todas as companhias de província, qualquer dos societários acumulava outra função com a de intérprete: encenador, cenógrafo, contra-regra, ponto, aderecista, secretário, ou bilheteiro.

O primeiro elenco conhecido (1918) compunha-se de dez atores – Rafael de Oliveira, Ema de Oliveira, Silva Vale, Laurinda Vale, Lucília Vale, José Carlos de Sousa, Edmundo de Sousa, Concórdia de Sousa, Lucília de Sousa e João Fernandes –, representando um reportório de uma vintena de peças, de diferentes géneros, pelos teatros de província, em permanente deambular pelo país.

Com o furor da 7ª Arte e a reconversão dos teatros em cine-teatros, Rafael de Oliveira viu-se compelido, em 1936, a mandar construir um Teatro Desmontável, que lhe conferiu maior autonomia face aos empresários locais, e melhorou as condições de representação. A frágil estrutura de madeira e zinco, «modesto conservatório ambulante da arte de Talma», com lotação para cerca de 800 pessoas, foi sofrendo sucessivas melhorias, consoante as necessidades físicas e artísticas da companhia. Inicialmente deslocado por via-férrea, a partir de 1960, após a inauguração, em Faro, da sua última versão, o transporte passou a ser feito em dez camiões, carregando dez toneladas, e requerendo quinze dias de montagem.

As décadas de 40 e 50 corresponderam ao período áureo da Companhia, que, em 1954, auferiu o primeiro apoio à exploração, através do S.N.I. (Secretariado Nacional de Informação), apoio esse sucessivamente renovado, através da rubrica relativa ao teatro itinerante do Fundo de Teatro. Apesar do despovoamento da província na década de 1960, a companhia manteve uma atividade regular pelo continente até à sua dissolução, em 1975.

O sonho de viajar levou a Companhia Rafael d’Oliveira, em 1947-48, a uma digressão por teatros do Funchal, de S. Miguel e da Terceira, e, em 1973, a deslocar o Teatro Desmontável em Angola. Ribeirinho encenou, então, um reportório de êxitos seus – À espera de Godot, Noite de Reis e Armadilha para um homem só – para um elenco alargado a artistas convidados: Canto e Castro, Rui de Carvalho, Tomás de Macedo e Hermínia Tojal. Em 1974, a Revolução de Abril alterou os planos de uma digressão a Moçambique e o sonho de se poder tornar na companhia de teatro nacional de Angola. Fernando de Oliveira, diretor da companhia desde a morte do seu pai, convidou Rogério Paulo a refazer a sua encenação cubana da peça proibida de Santareno, A traição do Padre Martinho. Esta subiu à cena no Teatro Maria Matos, em Setembro de 1974, passando para o palco do Desmontável (partilhado agora com a companhia Adoque), instalado no Largo de Martim Moniz, em Lisboa, antes de cumprir a sua vocação itinerante. Em Novembro desse ano, com o apoio do MNE (Ministério dos Negócios Estrangeiros) e do MFA (Movimento das Forças Armadas), a companhia deslocou-se ao Centro Cultural da Municipalidade de Pantin (Paris), num fim-de-semana cultural para emigrantes. Dissenções internas do elenco provocaram a substituição do diretor Fernando de Oliveira por uma autogestão de atores. Sem condições de funcionamento, a Companhia Rafael de Oliveira acabou por se dissolver em Agosto de 1975.

De um reportório médio de 40 peças, destacam-se como mais representadas Amor de perdição (1921-1973), de C. C. Branco, A Rosa do adro (1922-1974), de Manuel Maria Rodrigues, e As duas causas (1933-1972), de Mário Duarte e Alberto Morais. Há ainda quem recorde a Companhia Rafael de Oliveira, não só pelos espetáculos de feição popular, de estética naturalista, em que o sabor lacrimejante das paixões dava lugar à alegria esfusiante dos atos de variedades. Como companhia de província, o seu sucesso fez-se na participação da vida comunitária local, vivendo em casas alugadas, frequentando as escolas e os espaços de sociabilidade locais, dinamizando os grupos cénicos amadores e contribuindo para as instituições de solidariedade social, durante as suas permanências temporárias.

 

Bibliografia

FILIPE, José Guilherme Mora (2007). Percursos itinerantes – A companhia de Rafael de Oliveira, Artistas Associados. Dissertação de Mestrado em Estudos de Teatro, apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (texto policopiado).

MOURA, Nuno (2007). “ Indispensável dirigismo equilibrado”: O Fundo de Teatro entre 1950 e 1974. Lisboa: Dissertação de Mestrado em Estudos de Teatro, apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

VIEGAS, Mário (coord.) (1992). Rafael de Oliveira: O sonho de uma vida, caderno-programa nº 9 da Companhia Teatral do Chiado.

 

Consultar a ficha de instituição na CETbase:

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Guilherme Filipe/Centro de Estudos de Teatro

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joao.ramosmarques@camoes.mne.pt (João Marques) Destaque Teatro em Portugal - Instituições Teatro em Portugal Fri, 13 Nov 2015 11:52:26 +0000
Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/companhia-rey-colaco-robles-monteiro-dp27.html http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/companhia-rey-colaco-robles-monteiro-dp27.html

(1921-1974)

Criada pelo casal Amélia Rey Colaço e Manuel Robles Monteiro, ambos discípulos de Augusto Rosa (1852-1918), esta foi das mais importantes companhias da história do teatro português, particularmente do século XX.

  Rey Colaço-Robles Monteiro
  Robles Monteiro e Amélia Rey Colaço recém-casados, Foto Brasil, 1921 [MNT].

A sua primeira apresentação foi a polémica Zilda, de Alfredo Cortez, no Teatro Nacional S. Carlos, que imediatamente os demarcou da companhia do Teatro Nacional, de onde ambos haviam saído para criar esta nova empresa. Oito anos depois, em 1929, a Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro ganhou o concurso de exploração do Teatro Nacional, onde ficaram – entre sucessos e fiascos, épocas de ouro e dificuldades económicas – 35 anos, até ao incêndio de 1964 que quase destruiu aquele edifício. Pela companhia passaram os principais nomes da cena portuguesa da primeira metade do século XX (Ângela Pinto, Palmira Bastos, Samwell Diniz, Raul de Carvalho) e lá se iniciaram atrizes e atores que marcaram a segunda metade (como Eunice Muñoz, Carmen Dolores, João Perry, João Mota). Depois de 53 anos de existência da companhia, Amélia Rey Colaço deu por terminado o longo percurso deste projeto e a Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro foi extinta em maio de 1974.

A 18 de junho de 1921 apresentou-se ao público, pela primeira vez, uma nova companhia dramática: a Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro. O nome era inequívoco: o público da época estava familiarizado com a jovem atriz Amélia Rey Colaço, cujo percurso teatral havia sido iniciado auspiciosamente em 1917, e com o também ator Robles Monteiro, seu marido, ambos discípulos de Augusto Rosa. O projeto pretendia romper com o conservadorismo da cena teatral portuguesa, epitomizado pelo Teatro Nacional, que parecia prisioneiro do naturalismo reinante, debatendo-se com a falta de meios (humanos e económicos) viáveis para produções de qualidade. Era precisamente na companhia do Nacional que o casal de atores havia estado na época anterior, de 1920-21, como societários. A apresentação de Zilda, de Alfredo Cortez, com Amélia no papel principal, em março de 1921, havia desencadeado conflitos no interior da companhia, sobretudo pelo não-convencionalismo e pelo caráter desafiador da peça, o que em muito piorou as pequenas guerras de vaidades recorrentes no Nacional. E, embora tendo o aval da crítica – que via em Zilda um sinal de modernismo – e o interesse do público, a peça acabou por ser retirada de cena por ser considerada “moralmente condenável”. Foi a escolha ideal de Amélia Rey Colaço e Robles Monteiro para a estreia da sua própria companhia, apenas três meses depois, no Teatro Nacional S. Carlos.

O projeto contou desde logo com o apoio de António Pinheiro, que, inclusivamente, encenou os primeiros espetáculos da companhia, apresentados no S. Carlos até ao final de 1921. Depois de Zilda, a escolha recaiu sobre Marianela, adaptação dos Irmãos Quintero da peça de Pérez Galdós, o espetáculo onde com tanto sucesso Amélia se tinha estreado como atriz em 1917. As encenações de António Pinheiro e a interpretação de Amélia e Robles foram constantes nesta fase. E foi também durante este tempo que o bom gosto de Amélia se afirmou, aplicado aos figurinos e aos cenários que a pouco e pouco foram ganhando fama e atraindo público às apresentações.

Terminado o seu tempo no S. Carlos no final de 1921, os primeiros meses de 1922 foram passados em tournée, com uma estadia no Porto, onde, paralelamente, aceitaram o convite para participar numa adaptação cinematográfica de O primo Basílio, de Eça de Queiroz, estreada em 1923. Regressaram a Lisboa para se fixarem no Teatro Politeama, onde ficaram cerca de quatro anos, até ao verão de 1926. Seguiu-se o Teatro do Ginásio, que os acolheu na época de 1926-27, e o Trindade em 1928-29. Pelo meio, algumas apresentações no Porto e tournées às ilhas (Madeira e Açores) e ao Brasil. Até que, em 1929, Amélia e Robles se candidataram à exploração do Teatro Nacional (na altura, Teatro Almeida Garrett, só regressando ao nome original de D. Maria II em 1939). Fizeram-no apesar das condições pouco apelativas do concurso, que era bastante exigente quanto à concretização da função de um Teatro Nacional, e aos custos a isso associados, oferecendo em troca poucos e pobres apoios. A exploração foi-lhes adjudicada e, a 30 de dezembro de 1929, a Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro estreou-se no palco do Nacional com Peraltas e sécias, peça de Marcelino Mesquita.

O profissionalismo da Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro e o requinte das produções apresentadas contrastaram profundamente com a indisciplina e o desprestígio que tinham marcado até então as produções do Nacional. Não foi surpreendente, portanto, o tom laudatório da generalidade das críticas e o entusiasmo do público que acorria àquele teatro. E não foi surpreendente, também, a renovação sucessiva do contrato de exploração, mesmo após o fascínio inicial ter passado e a crítica se ter tornado mais exigente. A verdade é que enfrentaram também fases de difícil equilíbrio financeiro, o que os levou a vários pedidos de revisão das condições do contrato e de ajuda financeira ao governo, tendo Amélia feito alguns apelos diretos a Salazar. Conseguiram, durante a década de 30, construir um repertório nacional apresentando 116 peças portuguesas, das quais 63 em estreia. Nas décadas seguintes a companhia procurou levar à cena grandes autores contemporâneos que já há muito ocupavam os palcos estrangeiros, como Eugene O’Neill, Pirandello, Anouilh, Cocteau, Miller, Dürrenmatt, Ionesco e Lorca, entre outros. Mas o desejo de trabalhar autores modernos, estrangeiros e nacionais (como José Régio, Ramada Curto, Santareno, Rebello) era dificultado – e muitas vezes impedido, como com Sttau Monteiro e Brecht – pela censura, exigindo uma enorme capacidade de negociação e diplomacia da parte de Amélia e de Robles Monteiro. Esta foi uma constante ao longo da vida da companhia, cujo percurso “resume paradigmaticamente a história do teatro português sob o fascismo – no que fez, no que não fez e no que não lhe foi permitido fazer” (REBELLO 2000: 137). Realizou digressões pela província (é exemplo o Grupo dos Cinco, composto por Amélia, Robles, Palmira Bastos, Maria Clementina e Raul de Carvalho, que percorreu o país com várias apresentações a partir de julho de 1934), encenou grandes espetáculos ao ar livre (foram marcantes o Auto de Santo António (1934), no Adro da Sé de Lisboa, a Castro (1935), no Mosteiro de Alcobaça, e Sonho de uma noite de verão (1944) no Parque de Palhavã, atual Jardim da Fundação Calouste Gulbenkian) e organizou ciclos de conferências no Nacional, convidando oradores portugueses e estrangeiros, e procurando desenvolver um plano cultural bastante mais abrangente que a arte teatral. A companhia protagonizou alguns momentos marcantes do teatro em Portugal, como a estreia mundial de Um sonho, mas talvez não (1931), de Luigi Pirandello, com presença do autor; a utilização de uma placa giratória no palco pela primeira vez no país, em D. Sebastião (1933), de Tomaz Ribeiro Colaço; a estreia mundial de O padre Setúbal (1940), de Maeterlinck, escrita propositadamente para a companhia.

Amélia, além da interpretação (onde brilhava, recolhendo geralmente críticas positivas e ganhando um público fiel), foi responsável pela escolha de repertório, pela distribuição de papéis e, na maioria dos espetáculos, também pela montagem e decoração, que gozava de uma atenção especial, e cujo requinte se tornou quase estandarte da companhia. Robles Monteiro, embora sempre participando como ator na primeira fase, foi assumindo outras funções como a marcação das peças e o ensaio dos espetáculos, além do trabalho de gestão da companhia, encarregando-se do trabalho administrativo (após a sua morte, em 1958, Amélia dedicou-se também as estas tarefas, em detrimento da participação como atriz, e partilhou a direção do grupo com Mariana Rey Monteiro, filha de ambos e também atriz da companhia). Assinaram, em conjunto, muitas das encenações, tendo outras delas ficado a cargo de elementos convidados, como António Pinheiro, Luca de Tena, Meyenburg, Henriette Morineau, Varela Silva. E outras colaborações se traçaram para os cenários e figurinos, tendo Amélia convidado para o efeito artistas como Domingos Rebelo (O milhafre, 1927), Almada Negreiros (Actualidades X.P.T.O., 1927, e Dulcineia ou a última aventura de D. Quixote, 1944, entre outros), Stuart Carvalhais (A severa, 1931), Luigi Manini (Frei Luís de Sousa, 1932) e, de forma quase constante a partir dos anos 40, Lucien Donnat.

O elenco da companhia reuniu intérpretes com vários anos de experiência e reconhecimento público, mas também novos intérpretes. No primeiro caso, podemos citar Ângela Pinto, que com eles fez as suas últimas aparições em palco, Palmira Bastos, que integrou a companhia até ao final da sua carreira e encenou alguns dos espetáculos, Maria Clementina, Emília de Oliveira, Nascimento Fernandes, Samwell Diniz, Lucília Simões. Entre os novos que aqui tiveram a sua principal formação e lançaram as suas carreiras, podemos referir Raul de Carvalho, Maria Lalande, Álvaro Benamor, Augusto Figueiredo, Eunice Muñoz, Carmen Dolores e José de Castro. A coesão do elenco e a disciplina dos seus elementos foi uma das apostas de Amélia e Robles, como o comprova o exigente Regulamento dos ensaios e espetáculos (1965).

A presença da companhia no Teatro Nacional foi abruptamente interrompida com o incêndio de 2 de dezembro de 1964 que, embora tendo ocorrido durante a noite e não deixando vítimas, destruiu por completo o edifício e todo o espólio da companhia (figurinos, cenários, mobiliário, adereços), um espólio acumulado em 43 anos de atividade. Como prova de determinação e força, a 15 de dezembro (apenas doze dias depois), a companhia apresentou Macbeth, o espetáculo que estava em cena aquando do incêndio, no Coliseu dos Recreios, sem cenários e de luto. Para poder cumprir a concessão, a companhia arrendou o Teatro Avenida onde, após obras de recuperação (que implicaram empréstimos e dívidas pesadas que pairaram sobre a companhia e concretamente sobre Amélia durante anos), apresentaram a 6 de fevereiro de 1965 O motim, de Miguel Franco, com a presença do Presidente da República. Não foi surpreendente, poucos dias depois, a proibição do espetáculo e a relativa desorientação que marcou o grupo nos tempos seguintes, agravada em 1967 com outro incêndio no Avenida, quando representavam a peça de Pinter Feliz aniversário. A companhia passou então para o Teatro Capitólio – no Parque Mayer –, onde ficou de 1968 a 1970 (altura em que outro incêndio deflagrou quando tinham em cena Equilíbrio instável, de Edward Albee) e, de seguida, para o Teatro da Trindade, onde a companhia ficou de 1971 a 1974, partilhando a temporada com uma companhia de ópera e opereta, o que limitou os espetáculos a dois ou três por temporada. As crescentes dificuldades financeiras, acompanhadas por uma crítica pouco favorável e algum desinteresse do público, levaram Amélia a encerrar a companhia em maio de 1974, após 53 anos de atividade – um longo percurso de enorme responsabilidade, que mesmo as vozes mais críticas consideravam como tendo sido a companhia que “manteve aceso o único farol de luz decente” (António Pedro apud SANTOS 1989b: 213) e a quem “se devem os progressos que o teatro português possa ter atingido nos últimos anos” (Jorge de Sena apud SANTOS 1989b: 71).

 

Bibliografia

BARROS, Júlia Leitão de (2009). Fotobiografias século XX: Amélia Rey Colaço. Lisboa: Círculo de Leitores.

COLAÇO, Amélia Rey (1967). “Recordação de Pirandello” in Estudos Italianos em Portugal, nº28 (separata). Lisboa: Instituto Italiano de Cultura.

MARQUES, Paulo (2008). Amélia Rey Colaço: a Imperadora (1898-1990). Lisboa: Parceria A. M. Pereira Livraria Editora/Público.

REBELLO, Luiz Francisco (2000). Breve história do teatro português, 5ª ed. Mem Martins: Publicações Europa-América.

___ (2010). Três espelhos: uma visão panorâmica do teatro português do Liberalismo à Ditadura (1820-1926). Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda.

REY COLAÇO-ROBLES MONTEIRO, Empresa (1949). Vinte anos no Teatro Nacional Dona Maria II (1929-1949). Lisboa: Empresa Rey Colaço-Robles Monteiro.

___ (1965). Regulamento dos ensaios e espectáculos. Lisboa: Empresa Rey Colaço-Robles Monteiro.

SANTOS, Vítor Pavão dos (1989a). A Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro (1921-1974) [exposição imaginada e organizada por Vítor Pavão dos Santos]. Lisboa: Secretaria de Estado da Cultura/Museu Nacional do Teatro.

___ (1989b). A Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro (1921-1974): Correspondência [selecção e notas de Vítor Pavão dos Santos]. Lisboa: Secretaria de Estado da Cultura/Museu Nacional do Teatro.

SENA, Jorge de (1988). Do teatro em Portugal. Lisboa: Edições 70.

 

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http://ww3.fl.ul.pt/CETbase/reports/client/Report.htm?ObjType=Instituicao&ObjId=5759

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http://opsis.fl.ul.pt/

 

Joana d’Eça Leal/Centro de Estudos de Teatro

 

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cvinagre@instituto-camoes.pt (Cláudio Vinagre) Destaque Teatro em Portugal - Instituições Teatro em Portugal Fri, 30 May 2014 12:00:11 +0000
Conservatório Nacional http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/conservatorio-nacional-dp17.html http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/conservatorio-nacional-dp17.html

(Rua dos Caetanos, 29, Lisboa, Portugal)

Fundado em 1836, como documenta a portaria régia de 15 de novembro, subscrita por Passos Manuel – então ministro do reino –, o Conservatório Nacional ficou instalado no antigo Convento dos Caetanos (conhecido também como Hospício dos Clérigos Regulares Teatinos), em Lisboa, e teve em Almeida Garrett (1799-1854) o seu maior impulsionador.

  Conservatório Nacional
  Conservatório Nacional (fachada), 1959, fot. Fernando Manuel de Jesus Matias [Arquivo Municipal de Lisboa – Arquivo Fotográfico].

Instituição orientada essencialmente para o ensino das artes, procurava incentivar também a criação dramatúrgica. Idealizado inicialmente em 1834, no âmbito da Reforma Geral dos Estudos elaborada por Almeida Garrett e Joaquim Larcher, o Conservatório Geral de Arte Dramática nasceu com uma inusitada celeridade burocrática em consequência do contexto histórico que então se vivia.

Com o triunfo dos setembristas em 1836, e com a subida ao poder de Passos Manuel, Garrett foi instado, pela portaria de 28 de setembro, a apresentar “sem perda de tempo” um projeto de reestruturação do teatro nacional que, até então, se limitava a fracas adaptações de dramas franceses levadas à cena por atores mal preparados e exageradamente histriónicos. A 12 de novembro, Garrett cumpriu o que lhe fora pedido apresentando o seu projeto de reforma, tendo como base o documento que idealizara em 1834. Três dias depois, Passos Manuel fez publicar o diploma de 15 de novembro com os artigos que ditariam o início do Conservatório Geral de Arte Dramática, da Inspeção Geral dos Teatros e dos Espetáculos Nacionais (para os quais o autor de Frei Luís de Sousa foi imediatamente nomeado responsável) e do Teatro Nacional. Neste documento foram também designadas as escolas que integrariam o Conservatório (art.º 3, alínea 2): (1) a Escola Dramática ou de Declamação, que se dividia em Escola de Declamação Especial, Trágica e Cómica; Declamação aplicada à cena lírica e Declamação Oratória; (2) a Escola de Dança, Mímica e Ginástica Especial; (3) e a Escola de Música, com João Domingos Bomtempo na direção. Para os cargos de docência seriam contratados os melhores artistas da cena nacional. Foi ainda neste documento régio que se determinou a agregação do Conservatório de Música – inaugurado um ano antes e com sede na Casa Pia – ao Conservatório Geral de Arte. O corpo de disciplinas das três escolas contemplava cadeiras específicas para cada curso e cadeiras de ensino básico comuns a todas elas. A escola de teatro começou por oferecer aos seus alunos as cadeiras de Declamação, Reta Pronúncia, Linguagem e Rudimentos. Na sua conceção geral, os programas pedagógicos adotados inspiravam-se nos de instituições congéneres internacionais, nomeadamente o Conservatório de Paris. Os alunos – “de ambos os sexos, portugueses e estrangeiros” – (cf. portaria de 24 maio de 1841) pensionistas ou meio pensionistas, dividiam-se em ordinários (sujeitos a faltas e exames), voluntários e obrigados. (VASQUES 2012: 51) Era essencial para a sua inscrição que soubessem ler e escrever e apresentassem junto à instituição um atestado de bons costumes.

A intenção primeira de Garrett era lançar as bases de um verdadeiro teatro português, com autores portugueses e que se ajustasse à cena nacional, assim como garantir uma autonomia social e económica aos atores nacionais (VASQUES 2012: 46). Era função prioritária do Conservatório Geral de Arte Dramática formar artistas que viessem a criar uma nova companhia de atores nacionais, incentivar o aparecimento de novos autores dramáticos e elevar o gosto do público, garantindo, assim, ao teatro um caráter verdadeiramente civilizador. Com o regulamento do Conservatório, que o futuro Visconde apresentou a 24 de novembro de 1838 – assente nos estatutos das escolas artísticas de Paris, Milão e Londres – esta instituição, a funcionar desde 1839, foi ganhando o seu espaço, contando com um significativo aumento de alunos e de textos dramáticos originais e com uma publicação – O Jornal do Conservatório – como escaparate privilegiado da sua ação. No entanto, a sua atividade não foi contínua nem consensual. Devido às sucessivas epidemias de cólera e febre-amarela e às cheias do Tejo (1855) o edifício estava constantemente a ser solicitado como local de acolhimento das vítimas, sendo a instituição obrigada a interromper o seu funcionamento. Também a formação teória proporcionada pelo Conservatório foi duramente criticada pelos atores que se formaram com a experiência dos palcos amadores e foi vista por estes – desde o momento da sua implementação – como inútil. Porém, o Conservatório ia resistindo, apesar dos contratempos, e a primeira apresentação pública dos alunos ocorreu a 29 de maio de 1840, por ocasião do aniversário da Rainha D. Maria II. Nesse dia foi levado à cena o drama de Garrett Amor e pátria (posteriormente intitulado Filipa de Vilhena), no teatro do Salitre, pela Escola de Declamação, integrando ainda o espetáculo apresentações dos alunos da Escola de Dança e de Música.

Com a ação conjunta das três escolas na instituição, deixou de fazer sentido o nome atribuído inicialmente, pelo que a 4 de julho de 1840 passou a denominar-se Conservatório Real de Lisboa tendo D. Fernando – O Rei Artista – na sua presidência. Com a subida ao poder de Costa Cabral, a instituição sofreu alguns revezes: foi posta em causa pelo dispêndio que acarretava e, à ameaça de extinção – porém não concretizada, em parte devido à intervenção da Academia de Letras – juntou-se, a 16 de julho de 1841, a exoneração de Garrett de todos os cargos que ocupava, sucendendo-lhe o seu amigo Larcher na direção do Conservatório. A falta de investimento na organização e no seu corpo docente, bem como as constantes reduções nas pensões dos internos fizeram com que, pelo ano de 1842, se assistisse a um significativo número de desistências dos alunos que, sem o apoio necessário, foram obrigados a abandonar a escola.

Pelo decreto de 21 de novembro de 1861, e sob a direção de Duarte Sá, a Escola de Teatro (já na dependência direta do Teatro Nacional) sofreu uma reformulação pedagógica e a reestruturação implementada foi no sentido de criar um curso de declamação, independente do da arte de representar, passando a escola a denominar-se apenas Escola de Arte Dramática. Não obstante, em 1892, com Luis Augusto Palmeirim no cargo de diretor, foi suprimida a secção de arte dramática, que só voltaria a ser restabelecida em 1901, então com Eduardo Schwalbach na direção. Foi neste ano que se criaram também os conselhos de arte dramática e de arte musical.

Com a implantação da República, o Conservatório Real de Lisboa passou a intitular-se apenas Conservatório Nacional. No ano seguinte, a 22 de maio, autonomizou-se a denominada Escola Dramática e passou a nomear-se Escola de Arte de Representar. Em 1914 foi criado o curso de cenografia teatral e o de indumentária prática teatral. No ano de 1967 foi proposta, por Madalena Perdigão, uma reforma, que não tendo sido implementada nessa altura, serviu de base para a de 1971/72 que integrou o curso de cinema no Conservatório.

Passaram pelo Conservatório Nacional nomes incontornáveis do panorama literário e teatral português, como D. João da Câmara, Maria Matos, Lucinda do Carmo e Assis Pacheco no quadro dos docentes, e, enquanto alunos, o Conservatório deu à cena teatral portuguesa artistas como Maria Lalande, Irene Isidro, Eunice Muñoz, Maria Barroso, João Villaret e Ruy de Carvalho, entre muitos outros.

António Pinheiro frequentou-o como aluno no fim da década de oitenta do século XIX e regressou como professor na primeira década do século XX para aí ficar ligado à docência durante quase trinta anos. A ele se ficou a dever a introdução de uma nova reforma que contemplava o estudo da Estética e Plástica Teatral, Pantomima, Mímica e Caracterização, bem como o da Fisionomia. Tendo proposto o novo curriculum ao governo provisório saído da implantação da República em 1910, foi este que passou a vigorar na Secção de Arte Dramática que ele lecionava e que revelava uma atenção inovadora à plasticidade do trabalho do ator.

Na década de oitenta do século XX, já como Escola Superior de Teatro e Cinema (Decreto-Lei n.º 310/83, de 1 de Julho), o antigo Conservatório saiu do velho Convento dos Caetanos para a Amadora, ficando sediada em edifício construído de raiz.

 

Bibliografia

AA.VV. (1947). A evolução e o espírito do teatro em Portugal: 2º ciclo de conferências promovidas pelo “Século”. vol. II. Lisboa: Sociedade Nacional de Tipografias.

BASTOS, António de Sousa (1898). Carteira do Artista. Lisboa: Antiga Casa Bertrand.

___ (1947). Recordações de teatro, Lisboa: Editorial Século.

CRUZ, Duarte Ivo (1966). Almeida Garrett – Correspondência Inédita do Arquivo do Conservatório (1836-1841). Lisboa: Imprensa nacional Casa da Moeda.

___ (1988). “Estudo do Ensino do Teatro: De Garrett a 1970”, Conservatório Nacional – 150 anos de ensino do teatro: Homenagem a Almeida Garrett, Conferências realizadas no âmbito da comemoração dos 150 anos do Conservatório Nacional a 26,27 e 28 de Janeiro de 1987. ESTC: Centro de Documentação e Investigação teatral.

___ (1983). Introdução à história do teatro português. Lisboa: Guimarães Editores.

___ (1988). História do teatro português: O ciclo do Romantismo (do Judeu a Camilo). Lisboa: Guimarães Editores.

FERREIRA, Maria Gabriela (2007). Jornal do Conservatório: Comédia e Drama de Almeida Garrett. Tese de Mestrado em Texto Dramático Europeu apresentada à Faculdade de Letras da Universidade do Porto.

GAMEIRO, Luís (2011). António Pinheiro: Subsídios para a História do Teatro Português. Texto policopiado, Dissertação de Mestrado em Estudos de Teatro de FLUL.

REBELLO, Luiz Francisco (2000). Breve história do teatro português. 5ª ed. Mem Martins: Publicações Europa-América.

___ (1957). Dicionário do teatro português, Lisboa: Prelo Editora.

SCHWALBACH, Eduardo (1944). À lareira do passado: memórias. Lisboa: E. Schwalbach.

SEQUEIRA, Gustavo de Matos (1955). História do Teatro Nacional D. Maria II: publicação comemorativa do centenário 1846-1946. 2 vols. Lisboa: Oficinas Gráficas de Ramos, Afonso & Moita.

VASCONCELOS, Ana Isabel Teixeira (2003). O Teatro em Lisboa no tempo de Almeida Garrett. Lisboa: Museu Nacional do Teatro.

VASQUES, Eugénia (2012). A Escola de Teatro do Conservatório (1839-1901): Contributo para uma História do Conservatório de Lisboa. Lisboa: Gradiva.

 

Consultar a ficha de instituição na CETbase:

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Andreia Brito Silva/Centro de Estudos de Teatro

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cvinagre@instituto-camoes.pt (Cláudio Vinagre) Destaque Teatro em Portugal - Instituições Teatro em Portugal Wed, 09 May 2012 14:27:33 +0000
Escola-Teatro de Araújo Pereira http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/escola-teatro-de-araujo-pereira-dp11.html http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/escola-teatro-de-araujo-pereira-dp11.html

(Lisboa, 1924 – 1926)

A Escola-teatro, dirigida por Araújo Pereira, com a colaboração de César Porto, teve a sua origem na Escola-Oficina nº1, em Lisboa, bem como num desejo de renovação e dignificação do teatro português, que foi levado a cabo através da introdução de inovações estéticas nos seus espetáculos.

  Escola Teatro Araújo Pereira
  Postal [cedido por Jorge Silva Melo].

Apresentava um reportório construído de maneira independente e em estreita ligação com o seu programa de renovação teatral, composto predominantemente por originais portugueses contemporâneos. A Escola-teatro cessou as suas atividades em 1926.

A Escola apresentava os espetáculos no Teatro Juvénia, um barracão de alvenaria com um anfiteatro de 150 lugares e um palco, construído para o efeito na cerca da Escola-Oficina nº1, na Rua das Escolas Gerais, Freguesia de S. Miguel, em Alfama. Esta Escola-Oficina, gerida com base num “modelo de ensino libertário”, foi criada em 1905, “por impulso de maçons e anarquistas” e constitui apenas um dos vários exemplos práticos do desenvolvimento da educação nos meios operários (PROENÇA 2010: 173). Adolfo Lima foi seu diretor, cargo que acumulava com o de professor e dramaturgo.

Para frequentar a Escola-teatro, os alunos contribuíam consoante as suas possibilidades, e, para assegurar a sua existência, um «Grupo de Amigos do Teatro Juvénia» contribuía com uma quota. O seu mentor e figura central do projeto era comparado, por vezes, a André Antoine e a Jacques Copeau pela seriedade e “rigor didático” do seu projeto. (COELHO 2009:47).

Apesar da escassez de meios, Araújo Pereira introduziu na sua escola práticas inovadoras decorrentes das “suas convicções republicanas, socialistas e progressistas” com o intuito de formar atores livres dos habituais vícios dos profissionais (COELHO 2009: 45). Para tal, Araújo Pereira não permitia a existência de ponto, de maneira a obrigar os atores a uma maior concentração e conhecimento dos seus papéis. Desencorajou, também, os aplausos no teatro e o reconhecimento público na imprensa, ocultando os nomes dos atores, para “evitar a semente da vaidade, tão prejudicial ao espírito da sua obra” (COELHO 2009: 46). As mudanças de cenário ocorriam em silêncio perante os olhares da plateia, uma vez que o palco do Juvénia não tinha pano de boca, substituindo-se a sua função pelo acender e apagar das luzes da sala. Outra modificação significativa, que visava dispensar uma certa mundanidade foi a redução substancial da duração dos intervalos (que passariam a ter apenas dois a três minutos). As apresentações da sua Escola-teatro faziam-se de forma simples, sem recurso a figurinos elaborados ou cenários complexos, não apenas por falta de meios financeiros, mas por deliberada opção estética do encenador.

Não havia, nos critérios de escolha de reportório, qualquer preocupação em satisfazer o gosto dominante do público ou requisitos do circuito comercial, pautando-se, antes, por uma “exigência cultural” (COELHO 2009:47), que determinou opções como As irmãs (1903), de Gaston Devore, Quem matou? (1927), de João Carlos Chaby, Um serão familiar, de Adolfo Lima, A cilada (1914), de Pedroso Rodrigues e ...Amanhã (1902), de Manuel Laranjeira, bem como textos de Ibsen e Raul Brandão (O rei imaginário, 1923).

Com o golpe militar de 1926, a Escola-teatro viu chegar o seu fim prematuro devido à sua inclinação socialista, mas vários foram os elementos que por ela passaram e se mantiveram ligados à arte do palco, como, entre outros, Manuela Porto, António Vitorino, João Pedro de Andrade e Roberto de Araújo.

 

Bibliografia

Anon. (1928). “Araújo Pereira: Mestre de Teatro” in ABC, 24-05-1928.

BARREIRA, Luiz Carlos (2006). “Educação popular e renovação educacional em Portugal nas primeiras décadas do século XX: Escola Oficina n.º 1 de Lisboa, na ótica de Adolfo Lima”, in IV Congresso Luso-brasileiro da Educação: A educação e seus sujeitos na história (Actas). Goiana: Anais.

COELHO, Rui Pina (2009). Casa da Comédia (1946-1975): Um palco para uma ideia de teatro. Lisboa: Imprensa Nacional – Casa da Moeda.

G. V. [Guedes Vaz] (1925).“Escola-Teatro Araújo Pereira”, in De Teatro, nº 31, abril, pp. 13-15.

PROENÇA, Maria Cândida (2010). “A Educação” in História da Primeira República Portuguesa, coordenação de Fernando Rosas e Maria Fernanda Rollo. Lisboa: Tinta da China.

QUARTIN, Glicínia (2005). “A Escola Oficina n.º 1”, in Revista Artistas Unidos, nº 13, pp. 4 e 5.

REBELLO, Luiz Francisco (1978). “Juvénia, Teatro”, in Dicionário do teatro português, Prelo: Lisboa.

___ (1986) “Um teatro de dor e de sonho” in Teatro, Raul Brandão. Obras completas de Raul Brandão. Lisboa: Editorial Comunicação.

 

Consultar a ficha de instituição na CETbase:

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Diana Dionísio/Eunice Azevedo/Centro de Estudos de Teatro

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cvinagre@instituto-camoes.pt (Cláudio Vinagre) Destaque Teatro em Portugal - Instituições Teatro em Portugal Wed, 09 May 2012 14:05:24 +0000
Rosas & Brazão http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/rosas-a-brazao-dp10.html http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/rosas-a-brazao-dp10.html

(Lisboa, 1880-1898)

O grupo Rosas & Brazão, que recebeu o nome dos empresários e atores João Rosa, Augusto Rosa e Eduardo Brazão, foi responsável pela exploração do Teatro Nacional durante quase vinte anos, marcando o modo de fazer teatro no Portugal de finais do século XIX.

  Rosas & Brazão
  João Rosa - retrato do ator João Rosa, 1903 [Hemeroteca Digital]; / Augusto Rosa - retrato do ator Augusto Rosa, 1914 [Arquivo Municipal de Lisboa – Arquivo Fotográfico]; Eduardo Brazão - retrato do ator Eduardo Brazão, 1906 [Arquivo Municipal de Lisboa – Arquivo Fotográfico].

Houve, associada a esta companhia, uma modernização das práticas teatrais, que derivava do cuidado empregue na preparação dos espetáculos. A cenografia ganhou especial relevo (com uma importante colaboração de Luigi Manini) e a escolha de repertório foi significativa. De facto, além de impulsionadores da dramaturgia nacional levando à cena textos portugueses de autores estreantes, foram também responsáveis pelas primeiras representações de Shakespeare em Portugal, em língua portuguesa. A dissolução do grupo aconteceu pouco tempo após o impedimento de continuar a explorar o Teatro Nacional, tendo a sua última época teatral sido apresentada já no Teatro D. Amélia, em 1898.

O nome Rosas & Brazão engloba, além da companhia de teatro registada em 1893, outros grupos – ou, antes, variações do mesmo grupo – cujo núcleo foi constituído por três atores considerados de excelência na sua geração: Augusto Rosa, João Rosa e Eduardo Brazão. Deste modo, é aceite que esta designação engloba também o que terá sido o grupo precursor da Rosas & Brazão, já em 1880: a Sociedade de Artistas Dramáticos Portugueses, associada à empresa com o nome Brazão, Rosas e C.ª. Este grupo, constituído com o objetivo de se candidatar à exploração do Teatro de D. Maria II (frequentemente designado Teatro Normal) entre os anos de 1880 e 1883, tinha como societários Augusto e João Rosa, Eduardo Brazão, Carolina Falco, Emília dos Anjos, Emília Cândida, Virgínia Dias da Silva, Rosa Damasceno e Pinto de Campos.

Além dos referidos artistas societários, fizeram ainda parte deste grupo os atores contratados (/escriturados) Joaquim de Almeida, César de Lacerda, Augusto Antunes, entre outros. Juntaram-se-lhes, na qualidade de sócios ou escriturados, António Pedro (1882), Ferreira da Silva (1889), Chaby Pinheiro (1891), Lucinda do Carmo (1892), Lucinda Simões (1893) e Taborda (1894), para referir apenas alguns dos mais conhecidos.

Ao fim de doze épocas de exploração consecutiva do D. Maria, o acumular de tensões internas levou a uma reformulação da companhia. Por escritura de 28 de maio de 1893, constituiu-se uma nova empresa denominada Rosas & Brazão, tendo como sócios únicos os irmãos Augusto e João Rosa e Eduardo Brazão, passando os restantes atores do coletivo a escriturados. Foi este último nome que acabou por predominar, designando genericamente o coletivo existente desde 1880. O Teatro Normal foi-lhes mais uma vez adjudicado até à época de 1897/1898.

A colaboração, desde 1880, do cenógrafo italiano Luigi Manini (e, mais tarde, do seu sucessor Augusto Pina) e do figurinista Carlos Cohen, marcaram indelevelmente o estilo deste grupo, ambos orientados pela sensibilidade do próprio Augusto Rosa. O investimento estético nos espetáculos era reconhecido até pelos mais críticos, sendo pautado pelo estudo a que os dramas históricos obrigavam, pelo requinte da decoração de cena e pela riqueza dos materiais (algumas vezes vindos de Paris). A companhia instituiu a prática de pintura de novos cenários e de confeção de um guarda-roupa para cada novo espetáculo (diferente, portanto, do que acontecia antes, quando se reaproveitavam os materiais de espetáculo para espetáculo, fazendo-se alarido quando uma cena fosse nova).

A ação da Rosas & Brazão é referida como tendo contribuído para o desenvolvimento da dramaturgia nacional ao apresentar ao longo dos seus dezoito anos de atividade sessenta peças de vinte e sete autores portugueses, entre os quais alguns estreantes. O contrato de exploração do Teatro Nacional de D. Maria assinado em 1882 estipulava representações de textos de Gil Vicente, Almeida Garrett, Molière, Victor Hugo e Shakespeare – condição assumida pela empresa e impulsionada por Eduardo Brazão, tendo sido apresentadas pela primeira vez em Portugal e em língua portuguesa, por uma companhia profissional, as seguintes peças de Shakespeare: Othelo em 1882, Hamlet em 1887 e A fera amansada em 1896, até então só apresentadas por companhias estrangeiras.

Há quem veja nesta companhia uma precursora das práticas modernas do teatro na procura de uma unidade de estilo e de uma dinâmica global do espetáculo. Chegam, porém, até nós relatos que apontam ainda para antigas práticas de vedetismo romântico: dispensa dos ensaios, monopolização dos “papéis de apetecer”, etc. Outros relatos indicam, contudo, uma modernização, referindo a preparação cuidadosa de cada espetáculo e a distribuição rotativa dos papéis (atores de primeiro plano passam a desempenhar papéis secundários).

O paradigma de teatro da Rosas & Brazão era a Comédie Française, onde se iam comprar mise-en-scènes (peças com as marcações já feitas) recém-estreadas. Neste género, um dos sucessos da companhia foi A sociedade onde a gente se aborrece, de Édouard Pailleron, estreado em 1881 para a “burguesia triunfante de Lisboa” e para o próprio Rei D. Luís, assíduo frequentador do D. Maria e tradutor de teatro. Mesmo no seu melhor, este público não bastava para justificar mais de quatro dias de espetáculo por semana, tornando-se uma importante fonte de rendimento as digressões ao Porto e ao Brasil.

No reportório da fase final da Rosas & Brazão nota-se uma apetência pelo teatro simbolista e pelo novo teatro naturalista. No espetáculo João José, de Joaquim Dicenta, estreado em 1896, podemos ver uma tentativa de abordagem de temas mais afins do naturalismo, fugindo-se deliberadamente quer aos dramas históricos que marcaram uma fase do repertório da companhia (entre 1886 e 1892, possível resposta às frustrações provocadas pelo Ultimatum inglês), quer aos “problemas elegantes” do teatro de boulevard.

Em setembro de 1897, foi indeferido o pedido de prorrogação do prazo de exploração do Teatro de D. Maria pela Rosas & Brazão. Antes da inauguração da nova época de 1897- 1898, saíram Virgínia Dias da Silva, Ferreira da Silva (seu marido) e Augusto Melo - os quais viriam a integrar o coletivo que sucedeu à Rosas & Brazão na exploração do Teatro. Num decreto relativo ao novo programa de candidatura à concessão do D. Maria, publicado em agosto de 1898, um dos artigos proibia que artistas aposentados do antigo Teatro Normal fossem admitidos na nova sociedade artística. Era o caso de João Rosa. A companhia mudou-se a 13 de outubro de 1898 (levando consigo cenários, guarda-roupa, mobiliário, etc.) para o Teatro D. Amélia, onde apresentou o seu reportório durante uma época, ao fim da qual saiu Eduardo Brazão. A Rosas & Brazão acabou por se dissolver. Os irmãos Rosa e alguns elementos da antiga companhia continuaram a apresentar espetáculos no D. Amélia cujo empresário era o Visconde São Luiz Braga.

Às acusações de que a companhia era pouco sensível a inovações que se faziam no teatro com Antoine, Stanislavski e com os dramaturgos que iam surgindo na Europa de então, como Ibsen, Strindberg, Oscar Wilde, Bernard Shaw ou Tchekov, Augusto Rosa deixa-nos uma frase em que circunscreve toda esta realidade a “vanguardas que então mal se divisavam” (ROSA 1915: 198).

 

Bibliografia

BASTOS, Sousa (1947). Lisboa velha, sessenta anos de recordações (de 1850 a 1910). Lisboa: Câmara Municipal de Lisboa.

BRAZÃO, Eduardo (1925). Memórias de Eduardo Brazão que seu filho compilou e Henrique Lopes de Mendonça prefacia. Lisboa: Empresa da Revista de Teatro, Lda.

FLOR, João Almeida (1985). «Shakespeare, Rosas & Brazão», in Miscelânea de estudos dedicados a Fernando de Mello Moser. Lisboa: Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, p. 233-246.

REBELLO, Luiz Francisco (1984). 100 anos de teatro português (1880 – 1890). Porto: Brasília Editora.

ROSA, Augusto (1915). Recordações da scena e fóra da scena. Lisboa: Livraria Ferreira.

SANTOS, Vítor Pavão dos (Org.) (1979). A companhia Rosas & Brazão 1880 – 1898 (catálogo da exposição organizada pelo Museu Nacional de Teatro). Lisboa: Secretaria de Estado da Cultura.

SCHWALBACH, Eduardo (1944). À lareira do passado – memórias. Lisboa: Edição do Autor.

SEQUEIRA, Matos (1955). História do Teatro Nacional D. Maria II (publicação comemorativa do  centenário 1846 – 1946). Lisboa.

 

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Cláudia Oliveira/Joana d’Eça Leal/Centro de Estudos de Teatro

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cvinagre@instituto-camoes.pt (Cláudio Vinagre) Destaque Teatro em Portugal - Instituições Teatro em Portugal Wed, 07 Mar 2012 12:53:06 +0000
Teatro de Sempre http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/teatro-de-sempre-dp8.html http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/teatro-de-sempre-dp8.html

(1958-1959)

Criado a partir da empresa Laura Alves em 1958, o Teatro de Sempre surgiu com o objetivo de levar à cena textos ainda desconhecidos do público português mas reconhecidamente importantes para o teatro a nível mundial.

  Teatro de Sempre
  Programa O Gebo e a sombra, Teatro de Sempre, 1958 [cortesia do Museu Nacional do Teatro].

Como tal, sob a direção artística de Gino Saviotti, foram apresentadas peças de Goldoni, Pirandello e Raul Brandão, entre outros – aproveitando alguma latitude permitida pelos critérios mais leves de censura e o surgimento de uma tendência experimental no teatro português. Apesar da sua curta duração (extinguiu-se ao final de uma temporada, em 1959), o Teatro de Sempre contou com a colaboração de atores centrais da cena nacional como Carmen Dolores, Rogério Paulo, Adelina Campos ou Fernanda Alves.

A Companhia do Teatro de Sempre, embora projetada para pelo menos três anos, funcionou apenas durante a temporada de 1958-59, no Teatro Avenida, beneficiando ainda do abrandamento da censura verificado no final daquela década, em grande medida devido à proximidade das eleições presidenciais e às causas e efeitos da congregadora candidatura oposicionista de Humberto Delgado. Esta conjuntura revelou-se favorável à encenação, por profissionais, de peças que o salazarismo mantinha proibidas havia muito tempo, como Seis personagens à procura de autor (1921) e O Gebo e a sombra (1923), que tinham podido subir à cena em Portugal somente na década de 20, pela companhia italiana de Dario Niccodemi no Teatro Politeama (1923) e pela Companhia Alves da Cunha no Teatro Nacional (1927), respetivamente. Estas duas peças – a de Brandão no segundo espetáculo (estreia a 5 de dezembro de 1958) e a de Pirandello no quinto (estreia a 3 de abril de 1959) – constituíram os pontos altos do programa do Teatro de Sempre, que teve início com O mentiroso (1750), de Carlo Goldoni (estreia a 31 de outubro de 1958), texto até então inédito entre nós, também adequado ao propósito da Companhia de “dar ao público novo o conhecimento das várias formas representativas, desde os meados do século XVIII até ao fim da Primeira Guerra Mundial”, conforme os objetivos do projeto de candidatura aos subsídios do Fundo de Teatro. Para além das inovações formais que introduziram nas dramaturgias dos respetivos países (em todos os casos recusando o postulado da Poética de Aristóteles e propondo novos modos de olhar e entender a palavra/o texto e a interpretação), no caso dos italianos com repercussões à escala mundial, aquelas três peças tinham em comum preocupações do foro social, distintas mas ajustáveis ao contexto histórico, consentâneas com as motivações de vários membros do grupo.

O conjunto de seis espetáculos montados na temporada foi completado por três comédias de costumes (a primeira beneficiando do êxito de sucessivas adaptações ao cinema e as restantes, portuguesas, de estrutura frágil e abordagem temática convencional), dificilmente adequadas a um reportório que pretendia mostrar o “teatro de sempre” (pretensão que, de resto, baptizou a Companhia): O fim do caminho (1920, com o título original de Smilin’ Through), de Alan Langdon Martin, pseudónimo da parceria criativa constituída por Jane Murfin e Jane Cowl (estreia a 10 de janeiro de 1959); Marido em rodagem (1959), de Henrique Santos (estreia a 6 de fevereiro de 1959); e Fachada (1959), de Laura Chaves (estreia a 18 de maio de 1959).

Uma curiosa iniciativa editorial, paralela à estreia dos espetáculos, conduziu à publicação das cinco primeiras peças na coleção “Reportório do Teatro de Sempre” (a de Laura Chaves manteve-se inédita), expressamente criada sob a chancela técnica da casa Contraponto, que também integrou O mentiroso, Seis personagens à procura de autor e O Gebo e a sombra na sua coleção “Teatro no Bolso” (respetivamente, com os números 5, 7 e 9).

A Companhia do Teatro de Sempre foi criada por iniciativa da Empresa Laura Alves, com administração e gerência entregues ao também empresário Giuseppe Bastos e direção artística confiada a Gino Saviotti, diretor do Instituto Italiano de Cultura e professor do Conservatório Nacional, responsável por quatro das seis encenações (as restantes, de Marido em rodagem e Fachada, foram assinadas por Henrique Santos). O elenco integrou um grupo de atores com diferentes percursos artísticos, desde jovens profissionais (Catarina Avelar, Fernanda Alves, Mário Pereira ou o estreante Armando Caldas) a figuras reconhecidas que haviam passado pelo Teatro Nacional (Samwel Diniz, Adelina Campos, Henrique Santos, Madalena Sotto), destacando-se, neste último grupo, pelo seu “muito prestígio” (lê-se no projecto da Companhia), Rogério Paulo e Carmen Dolores (foram, de resto, os únicos atores que participaram nos seis espetáculos). Redondo Júnior e Grazia Maria Saviotti, nas traduções, ou, para além desta última, com o pseudónimo de Graz, também Manuel de Oliveira, Fernando Ramalho ou Reinaldo Martins, na realização plástica do espetáculo, foram alguns dos que ali prestaram colaboração. É possível que, apesar do apoio do Fundo de Teatro, as dificuldades financeiras tenham estado na base da prematura extinção do Teatro de Sempre, companhia que, todavia, fica grafada na historiografia teatral portuguesa por ter devolvido ao público, no difícil contexto da ditadura salazarista, alguma dramaturgia “de sempre”.

 

Fontes

MNT (Museu Nacional do Teatro), Fundo de Teatro, Pasta Nº 80 (“Expediente das Empresas Subsidiadas, Empresa Laura Alves”). 

Bibliografia

DOLORES, Carmen (1958). “Carta de Carmen Dolores para Robles Monteiro” (s.d)”, in Vítor Pavão dos Santos (selecção e notas) (1989). A Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro (1921-1974): Correspondência. S.l: Secretaria de Estado da Cultura/ Museu Nacional do Teatro, pp. 113-114.

___ (1984). Retrato inacabado: memórias. Lisboa: O Jornal.

FALCÃO, Miguel (2008). “Companhia do Teatro de Sempre: No cinquentenário de uma temporada ‘única’” in Sinais de Cena n.10. APCT / CET, pp. 121-129.

PAULO, Rogério (1958). “Carta de Rogério Paulo para Amélia Rey Colaço e Robles Monteiro” (26 de Setembro)”, in Vítor Pavão dos Santos (selecção e notas) (1989). A Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro (1921-1974): Correspondência. S.l: Secretaria de Estado da Cultura/ Museu Nacional do Teatro, pp. 134-136.

SAVIOTTI, Gino (1959). “Gino Saviotti fala à Plateia: “Queremos fazer um teatro para todos os públicos”, Plateia, 1 de Janeiro, p. 22.

___ (1958). “Como encenei o Gebo e a sombra” in O Gebo e a sombra, Raul Brandão, Coleção Reportório do Teatro de Sempre. Lisboa: Tipografia Portuguesa.

 

Consultar a ficha de instituição na CETbase:

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Miguel Falcão/Centro de Estudos de Teatro

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cvinagre@instituto-camoes.pt (Cláudio Vinagre) Destaque Teatro em Portugal - Instituições Teatro em Portugal Wed, 09 May 2012 14:19:12 +0000
Teatro Estúdio do Salitre http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/teatro-estudio-do-salitre-dp11.html http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/teatro-estudio-do-salitre-dp11.html

(Lisboa, 1946-1950)

O Teatro-Estúdio do Salitre surgiu em abril de 1946, numa época de “crise” do teatro português em que os rumos estavam indefinidos e os cânones eram questionados.

  Teatro Estúdio do Salitre
  Grupo inicial do Teatro-Estúdio do Salitre, s.d. [espólio de Luiz Francisco Rebello].

O final da Segunda Guerra Mundial tinha, de certa forma, abalado as fundações do regime e enfraquecido a censura que durante tanto tempo havia determinado os modelos artísticos da cena portuguesa, o que permitiu alguma latitude na escolha de textos e práticas que se refletiu no aparecimento do movimento experimental. Gino Saviotti, Vasco Mendonça Alves e Luiz Francisco Rebello impulsionaram no Salitre o rumo experimentalista que, apoiado num Manifesto, procurava romper com o naturalismo, por demais enraizado no teatro, e explorar estéticas modernistas e simbolistas. Os Espetáculos essencialistas (com novos textos de autores nacionais e estrangeiros) deixaram a sua marca no panorama teatral português e abriram caminho para os movimentos experimentais que se seguiram, mesmo após a extinção do grupo em 1950.

Instalado numa sala adaptada do Instituto Italiano de Cultura (na Rua do Salitre, em Lisboa), inaugurada para esse fim em 1946, o Teatro Estúdio do Salitre marcou – apesar das vicissitudes da conjuntura histórico-política e cultural do país e da heterogeneidade estética e artística do grupo – o início do movimento experimental no teatro português do pós-guerra. Surgiu por iniciativa de um grupo de homens e mulheres das letras e das artes empenhados em participar na renovação da cena portuguesa, entre os quais Armando Vieira Pinto, Eduardo Scarlatti, Jorge de Faria, Manuela Azevedo e Luiz Francisco Rebello. Aproveitando um dos raros períodos de abrandamento da censura e na presunção de uma abertura do país ao exterior, constituíram formalmente o Círculo de Cultura Teatral, em 1945, embora vários de entre eles estivessem já unidos pela intensa atividade intelectual que caracterizava as tertúlias realizadas desde o início da década em casa de Gino Saviotti, diretor daquele Instituto, também ele dramaturgo, tradutor e encenador. É, aliás, da sua autoria, a principal produção teórica, publicada em livros – Paradoxo sobre o teatro (1944) e Filosofia do teatro (1945) – e em periódicos, sustentando a ideia de renovação do teatro por via da sua “reteatralização”, baseada grosso modo na necessária distinção, embora nem sempre reconhecida, entre literatura dramática e especificidade cénica, com implicações diretas na forma de entender, em particular, o texto, a encenação, a representação e a componente plástica do espetáculo.

No dia da estreia do espetáculo inaugural, a 30 de abril, o público tomou contacto, desde logo, com três dados que evidenciavam a tentativa de compatibilizar pontos de vista e opções estéticas e artísticas, mas que os cerca de cinco anos de atividade confirmariam serem inconciliáveis, pelo menos na perspetiva da afirmação de uma linha ou sequer de uma tendência: (1) a direção, integrando personalidades com gostos e interesses reconhecidamente distintos (Gino Saviotti, Vasco de Mendonça Alves e Luiz Francisco Rebello, este, em assumida rutura com os demais, substituído por Pedro Bom a partir do 6º espetáculo, em 1947); (2) o “Manifesto do essencialismo teatral”, uma carta de intenções marcada pela insipiência e incongruência das posições, pondo lado a lado a defesa da “teatralidade” (na esteira das teses de Saviotti) e a negação de referentes que com ela poderiam ligar-se (como a obra de Gordon Craig); e (3) o próprio programa do espetáculo, para o qual foram selecionadas quatro peças, cujos tratamentos formal e temático espelhavam a heterogeneidade da composição do grupo (O homem da flor na boca, de Luigi Pirandello, O beijo do Infante, de D. João da Câmara, Maria Emília, de Alves Redol, e Viúvos, de Vasco de Mendonça Alves).

Até 1950, ali subiram à cena dezassete espetáculos a partir de quarenta e três textos (trinta e um de autores portugueses, dos quais vinte e sete contemporâneos), desde peças paradoxalmente radicadas no contestado naturalismo a peças surpreendentemente inovadoras, referidas a matrizes estéticas com as quais o público português não estava – ou estava pouco – familiarizado (como o expressionismo em O mundo começou às 5 e 47, de Luiz Francisco Rebello, ou o surrealismo em A fábula do ovo, de Carlos Montanha). Estes dados são reveladores da amplitude do envolvimento de dramaturgos, tanto veteranos como jovens (Luna de Oliveira e Luís de Oliveira Guimarães ou Fernando Amado e David Mourão-Ferreira, entre outros), passando também por escritores reconhecidos que não haviam tido ainda as suas peças encenadas (como Almada Negreiros, Branquinho da Fonseca ou João Pedro Andrade), para além do alargamento do reportório à dramaturgia universal, de Marivaux a Tchekov, com especial destaque para a italiana, de Carlo Gozzi ou Vittorio Alfieri a Pirandello (este autor com forte ascendência em muito do que ali se fez). Os atores tinham proveniências diversas, desde amadores (a maioria) a profissionais reconhecidos (como João Villaret e Laura Alves), integrando também dezenas de jovens estudantes do Conservatório Nacional, que ali encontraram oportunidades de experimentação cénica, alguns dos quais vieram a tornar-se primeiras figuras do teatro português, como Armando Cortez, Carlos Wallenstein, Fernanda Borsatti, Isabel de Castro, Rogério Paulo ou Ruy de Carvalho. O leque de artistas estendeu-se a outras áreas da conceção do espetáculo, especialmente à cenografia, na qual colaboraram pintores como Júlio de Sousa, Sarah Afonso ou o próprio Almada Negreiros.

Embora não tendo adquirido os contornos de “escola” ou “movimento”, como alguns chegaram a propor, e mesmo sem ter alterado radicalmente o cristalizado panorama teatral da época, como era pretensão dos seus fundadores, o Salitre inovou a cena lisboeta. E demonstrou, com repercussão nacional e internacional (André Veinstein integrou-o no conjunto de “teatros de ensaio” mais inovadores, a par dos grupos de Baty, Dullin, Chancerel, Meyerhold ou Piscator), que era possível “reconquistar a essência do teatro” (conforme a proclamação do Manifesto) e que a arte poderia ser recriação – e não apenas reprodução – do real, constituindo um estímulo para outras iniciativas artísticas e um incentivo para o surgimento de um conjunto importante de grupos experimentais.

 

Bibliografia

ANON. (1946). “O Teatro Estúdio e a sua função cultural”, Baliza, 26 de Maio, p. 2.

FALCÃO, Miguel (2005). Espelho de ver por dentro: O percurso teatral de Alves Redol. Tese de Doutoramento em Estudos de Teatro, apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa (texto policopiado).

REBELLO, Luiz Francisco (1971). O jogo dos homens. Lisboa: Ática.

REDOL, Alves et. al. (1996). Teatro Estúdio do Salitre: Lisboa, 50 anos. Lisboa: Sociedade Portuguesa de Autores/Publicações Dom Quixote.

SAVIOTTI, Gino (1945). “Premissas para a constituição em Lisboa de um Estúdio Teatral”, Acção, 30 de Agosto, pp. 1 e 4.

VEINSTEIN, André (1955). La mise en scène théâtrale et sa condition esthétique. Paris: Flammarion.

 

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Miguel Falcão/Centro de Estudos de Teatro

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cvinagre@instituto-camoes.pt (Cláudio Vinagre) Destaque Teatro em Portugal - Instituições Teatro em Portugal Wed, 09 May 2012 14:23:55 +0000
Teatro Livre http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/teatro-livre-dp11.html http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/teatro-livre-dp11.html

(Lisboa, 1904-1908)

Fundado em Lisboa por Araújo Pereira e por Luciano de Castro, em 1904, na esteira do Théâtre Libre de André Antoine (que se apresentara em Lisboa em junho de 1903), foi um dos grupos que, no início do século XX, se constituiu como um dos mais firmes indicadores de uma vontade de renovação cultural e teatral, que se “propunha dar rejuvenescimento e trazer uma nova seiva ao teatro português, infestado de retrógradas ideias” (REBELLO 2000: 120).

  Teatro Livre
  A maternidade, de Eugène Brieux, enc. António Pinheiro, Teatro Livre, 1905 [A Illustração Portugueza, 26-06-1905, p.539].

Os seus ideais na regeneração do teatro português, intimamente ligados ao realismo/naturalismo que já se fazia sentir noutras capitais, eram, no entanto, mais consistentes que as suas práticas teatrais – o que levou à dissolução do grupo ao final de apenas três épocas.

O arranque da iniciativa deu-se com um conjunto de três conferências realizadas no Ateneu Comercial de Lisboa, em dezembro de 1902, proferidas por Teófilo Braga, Heliodoro Salgado e Ernesto da Silva. A deste último, realizada a 14 de dezembro de 1902, recebeu o título de Teatro livre & Arte social, que revela o caráter progressista e libertário do grupo. Foi com claros intuitos de renovação cultural, inspirados nos princípios da estética realista e naturalista, que o Teatro Livre se apresentou no palco do Teatro do Príncipe Real, à Rua da Palma, em Lisboa, sob a direção artística de Araújo Pereira. Para o espetáculo de estreia foi escolhido um texto do repertório de Antoine, Tante Léontine, de Maurice Boniface e Edouard Boudin (em português, A moral deles) e um fragmento do prólogo dramático …Amanhã, de Manuel Laranjeira. Mais tarde, a 19 de abril de 1904, o Teatro Livre estreou ainda a peça Em ruínas, de Ernesto da Silva e o ato de Octave Mirbeau, A carteira.

Na segunda temporada (de 16 de junho a 31 de julho de 1905), então com gestão de César Porto, Luís da Mata, Adolfo Lima e Severino de Carvalho e com a direção artística de António Pinheiro, o Teatro Livre apresentou, no Teatro do Ginásio, em Lisboa, O condenado de Valentim Machado, Às feras de Manuel Laranjeira (escrita propositadamente para o Teatro Livre), Os que furam de Emídio Garcia, e Missa nova de Bento Faria. Do repertório internacional levaram à cena: A maternidade de Brieux, Confissão de amigo, adaptação de um conto de Sudermann, Pai natural de Ernest Dupré e Paul Charton, A prosa de Gaston Salandri, Uma falência de Björnson, e As vítimas de Frédéric Boutet. Esta segunda temporada, apresentada no Teatro do Ginásio, evidenciou um desvio relativamente aos propósitos anunciados pelo grupo, o que motivou um certo desfavor da crítica e o desinteresse do público – um público maioritariamente urbano e burguês.

O Teatro Livre só regressou em 1908, numa última temporada dirigida por António Pinheiro no Teatro D. Amélia, apresentando Entre dois fogos de Emídio Garcia, O triunfo de Carrasco Guerra, A gaiola de Lucien Descaves e A tranquilidade do lar de Guy de Maupassant, onde ao fulgor naturalista se substituiu já “uma corrente mística ou idealista”, concessão que se provou inconciliável com o projeto de fundo e que terá, de algum modo, precipitado o fim do grupo.

 

Bibliografia

COELHO, Rui Pina (2009). Casa da Comédia (1946-1975): um palco para uma ideia de teatro. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda.

MADUREIRA, Joaquim (1905). Impressões de theatro (cartas a um provinciano e notas sobre o joelho). 1ª série (1903-1904). Lisboa: Ferreira & Oliveira, Lda. Editores.

PINHEIRO, António (1929). Contos largos... (impressões da vida de teatro) – 1900-1925. Lisboa: Tip. Costa Sanches / Sucessores Galhardo & Costa, Ltd.

REBELLO, Luiz Francisco (2000). Breve história do Teatro português. 5ª edição. Lisboa: Publicações Europa-América, pp. 119-122.

___ (2005). “Um duplo centenário: o ‘Teatro Livre’ e o ‘Teatro Moderno’” in Sinais de cena, nº.3, Junho, pp.57-60.

REBELLO, Luiz Francisco / FADDA; Sebastiana (2010). “Transformar pela arte, redimir pela educação”, in Sinais de cena, n.º14, Dezembro, pp. 119-128.

SILVA, Ernesto da (1902). Teatro livre & arte social. Lisboa: Tipografia do Comércio.

 

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Rui Pina Coelho/Centro de Estudos de Teatro

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cvinagre@instituto-camoes.pt (Cláudio Vinagre) Destaque Teatro em Portugal - Instituições Teatro em Portugal Wed, 07 Mar 2012 12:53:50 +0000
Teatro Moderno http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/teatro-moderno-dp10.html http://www.cvc.instituto-camoes.pt/teatro-em-portugal-instituicoes/teatro-moderno-dp10.html

(Lisboa, 1905)

No final da primeira temporada do Teatro Livre, em 1905, Araújo Pereira e Luciano de Castro abandonaram esse projeto para fundar, com Simões Coelho, o Teatro Moderno, que ficou sediado no Teatro do Príncipe Real, à Rua da Palma, em Lisboa (onde se apresentara antes o Teatro Livre).

  Teatro Moderno
  Cartaz da apresentação de 08-07-1905 no Teatro do Príncipe Real (espetáculos O stygma, Degenerados, e Mau caminho) [REBELLO, Luiz Francisco, Três espelhos. Lisboa: INCM, 2010, p. 338].

Integraram ainda esta companhia António Sacramento e as atrizes Maria das Dores, Palmira Torres e Virgínia Nery. O enquadramento teórico e artístico deste grupo não diferiu muito do que caracterizou o Teatro Livre: as referências estéticas eram comuns, radicando no naturalismo teatral de André Antoine.

O Teatro Moderno teve, contudo, uma existência ainda mais efémera do que o seu antecessor, durando apenas o mês de julho de 1905. Sob a direção artística de Araújo Pereira, destacou-se por ter levado à cena um repertório exclusivamente português, com textos de Ramada Curto (O estigma), Carrasco Guerra e Eloy do Amaral (Mau caminho: Episódio doloroso), Bento Mântua (Novo altar), Mário Gollen (Degenerados), Afonso Gayo (Quinto mandamento), Amadeu de Freitas e Luís Barreto da Cruz (A lei mais forte).

Os seus propósitos de democratização da arte teatral, pelo desejo de chegar às grandes camadas da população – uma população interrogadora, cujo esclarecimento é dever do Teatro – esteve patente na fórmula “transformar pela Arte, redimir pela Educação” (REBELLO 2005: 60). Como tal, foram os problemas do homem comum os procurados nas dramaturgias escolhidas, com vista ao desenvolvimento de um espírito crítico que tornasse o público mais ativo nos destinos pessoais e coletivos da realidade em que se inseria.

 

Bibliografia

AA. VV. (1965). O papel do teatro na sociedade contemporânea. Lisboa: Prelo.

COELHO, Rui Pina (2009). Casa da Comédia (1946-1975): um palco para uma ideia de teatro. Lisboa: Imprensa Nacional-Casa da Moeda.

MADUREIRA, Joaquim (1905). Impressões de theatro (cartas a um provinciano e notas sobre o joelho). 1ª série (1903-1904). Lisboa: Ferreira & Oliveira, Lda. Editores.

PINHEIRO, António (1929). Contos largos... (impressões da vida de teatro) – 1900-1925. Lisboa: Tip. Costa Sanches / Sucessores Galhardo & Costa, Ltd.

REBELLO, Luiz Francisco (2000). Breve história do Teatro português. 5ª edição. Lisboa: Publicações Europa-América, pp. 119-122.

___ (2005). “Um duplo centenário: o ‘Teatro Livre’ e o ‘Teatro Moderno’” in Sinais de  cena, n.º3, Junho, pp. 57-60.

SILVA, Ernesto da (1902). Teatro livre & arte social. Lisboa: Tipografia do Comércio.

 

Consultar a ficha de instituição na CETbase:

http://ww3.fl.ul.pt/CETbase/reports/client/Report.htm?ObjType=Instituicao&ObjId=9481

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Rui Pina Coelho/Centro de Estudos de Teatro

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cvinagre@instituto-camoes.pt (Cláudio Vinagre) Destaque Teatro em Portugal - Instituições Teatro em Portugal Wed, 07 Mar 2012 12:56:41 +0000