Desfecho


Não tenho mais palavras.

Gastei-as a negar-te...

(Só a negar-te eu pudesse combater

O terror de te ver

Em toda a parte.)

Fosse qual fosse o chão da caminhada,

Era certa a meu lado

A divina presença impertinente

Do teu vulto calado

E paciente...

E lutei, como luta um solitário

Quando alguém lhe perturba a solidão.

Fechado num ouriço de recusas,

Soltei a voz, arma que tu não usas,

Sempre silencioso na agressão.

Mas o tempo moeu na sua mó

O joio amargo do que te dizia...

Agora somos dois obstinados,

Mudos e malogrados,

Que apenas vão a par na teimosia.

Miguel Torga

Antologia Poética

Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1999


Miguel Torga

MIGUEL TORGA

Adolfo Correia da Rocha nasceu a 12 de Agosto de 1907 em São Martinho de Anta, Trás-os-Montes. Licenciou-se em Medicina e especializou-se em Otorrinolaringologia.

Como escritor, tornou-se conhecido sob o pseudónimo literário de Miguel Torga e durante muitos anos foi o editor dos seus próprios livros.

Colaborou na revista presença e foi director das revistas Sinal e Manifesto.

Recebeu vários prémios em Portugal e no estrangeiro e a sua obra encontra-se traduzida em várias línguas.

Faleceu a 17 de Janeiro de 1995, em Coimbra.


Algumas obras

Poesia

Rampa (1930)

Abismo (1932)

O Outro Livro de Job (1936)

Nihil Sibi (1948)

Orfeu Rebelde (1958)

Poemas Ibéricos (1965)

Antologia Poética (1981)


Prosa

O Senhor Ventura (1943) – novela

Vindima (1945) – romance

Bichos (1940) – contos

Novos Contos da Montanha (1944) – contos

Mar (1941) – teatro

O Paraíso (1949) – teatro

Fogo Preso (1976) – ensaio

Traço de União (1995) – ensaio

Diário I (1941-1959)

Diário II (1964-1993)


Para saber mais sobre São Martinho de Anta.

Sobre Miguel Torga.

Outro poema de Miguel Torga.


© Instituto Camões, 2003